POLICIAMENTO PREDITIVO E A VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS
ESTUDO DE CASO DO SISTEMA DA ORACLE
Palavras-chave:
Tecnoautoritarismo; policiamento preditivo; presunção de inocência; segurança pública.Resumo
A sociedade pós-moderna pode ser descrita como uma sociedade de risco, na qual a insegurança e a consciência dos riscos são sentimentos constantes e crescentes e onde o discurso do inimigo interno [e eterno] toma forma. Como resposta, a implementação de sistemas tecnológicos com a finalidade de aumentar a eficiência do policiamento e a segurança pública tornou-se uma tendência em todo o mundo. Um exemplo dessa tendência foi a compra de softwares da empresa Oracle pela Polícia do Rio de Janeiro em 2013. A tecnologia vendida pela multinacional promete realizar o que se chama de “policiamento preditivo” por meio da técnica de aprendizado de máquina (machine learning), isto é, o software coleta dados e informações das mais diversas redes sociais e do banco de dados da própria polícia, faz o cruzamento desses dados e simula “previsões” de crimes, bem como determina as “áreas de risco” dentro de uma cidade. Assim, com uma análise mais robusta, o policiamento preditivo pode, por exemplo, apontar chances de um futuro crime acontecer em lócus. No entanto, essa tecnologia viola a garantia constitucional da presunção de inocência ao tentar prever crimes que ainda não aconteceram e, consequentemente, classificar determinados sujeitos como suspeitos desse crime - gerando um efeito “minority report”. Ademais, rotula regiões como “focos” de criminalidade, sem qualquer prova efetiva (ausência de materialidade), baseando-se apenas em dados - que incorrem no risco de serem imprecisos - e, portanto, gerando respostas carregadas de vieses (bias) que podem resultar num aprofundamento da estigmatização social e o agravamento do racismo estrutural no Brasil. Diante desse contexto, a presente pesquisa pretende investigar qual é o limite da finalidade da segurança pública e como ela vem ultrapassando a esfera das garantias constitucionais (como privacidade e presunção da inocência) sob o manto do inimigo interno. Para isso, em um primeiro momento examina-se a natureza da tecnologia. Em um segundo momento explicita-se os riscos de enviesamento no cruzamento de dados e as sequelas sociais. E, por fim, aponta-se a supressão de direitos humanos e garantias constitucionais em nome da “segurança pública” revelando o caráter autoritário de tais tecnologias. A pesquisa realizou-se mediante o método hipotético-dedutivo, tendo natureza bibliográfica e documental com objetivos exploratórios e descritivos. Da análise inicial, conclui-se que a partir do momento que essas tecnologias reforçam discriminações e desigualdades sociais e violam direitos e garantias constitucionais, a finalidade da segurança pública torna-se ilegítima. Com isso, ferramentas desta natureza se deslocam para um polo autoritário que não apresenta uma solução efetiva para as questões sociais, mas institucionaliza tecnologicamente a repressão e a vigilância de grupos que historicamente se encontram à margem da sociedade.