A EXEQUIBILIDADE DIRETA DOS DIREITOS ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS NA DECISÃO LAGOS DEL CAMPO VS PERU

Autores

  • Wilson Seraine da Silva Neto Universidade de Coimbra

Palavras-chave:

DIREITOS SOCIAIS, EXEQUIBILIDADE DIRETA, LAGOS DEL CAMPO VS. PERU, CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

Resumo

Apesar dos direitos humanos serem caracterizados como universais, indivisíveis e interdependentes, eles passaram, por razões históricas, políticas e ideológicas, a serem vistos separados em dois grandes grupos: (i) os direitos civis e políticos e (ii) os direitos econômicos, sociais e culturais. Contudo, apesar da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ter produzido efeitos satisfatórios, principalmente sobre a ordem jurídica interna (no qual inúmeras Constituições a colocaram como topo interpretativo dos direitos fundamentais positivados), a força normativa-vinculativa de tais direitos se concretizou por velocidades e maneiras diferentes. Enquanto os direitos civis e políticos detiveram uma aplicabilidade imediata, os direitos sociais foram normatizados apenas como normas programáticas, sem força de exequibilidade. A Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) ou Pacto de São José da Costa Rica de 1969 - na esteira do que se promulgou no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) de 1966 - tratou os direitos sociais como normas programáticas (conforme consta em seu art. 26), que visa obrigar o Estado-Parte a, progressivamente, realizar a concretização de tais direitos. Por sua natureza ausente de aplicabilidade imediata, portanto, os direitos sociais não gozam de justiciabilidade (ou exequibilidade direta), de modo a levar a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a utilizar esforços retóricos e argumentativos para promover a proteção de tais direitos em sua jurisprudência: como exemplo, a utilização da tese da dimensão positiva do direito à vida de modo a afirmar que o Estado deve adotar medidas positivas de proteção a uma vida digna: o direito a criar e desenvolver um projeto de vida (Villagran Morales vs. Guatemala, 1999).  Entretanto, em 31 de agosto de 2017, a Corte Interamericana, em Lagos del Campo vs. Peru, decidiu pela exequibilidade direta dos direitos sociais, em uma interpretação inovadora e extensiva do Art. 26 da CADH, dotando assim os direitos econômicos, sociais e culturais de justiciabilidade. No caso, o tribunal condenou Peru por violação específica do artigo citado, entendendo que o Estado feriu os direitos à segurança no emprego do Sr. Lagos del Campo. A respectiva decisão ganhou importância internacional por ser a primeira a instituir exequibilidade direta aos direitos sociais, tendo sido já utilizada como precedente em outras duas decisões posterior da CIDH. Dessa forma, utilizando-se de referências bibliográficas e documentais, a pesquisa busca demonstrar o desenvolvimento da justiciabilidade dos direitos sociais, desde a promulgação do PIDESC e seu Protocolo Facultativo de 2008 e da CADH e o Protocolo de San Salvador até a decisão de 2017 da CIDH que, de maneira inédita, condenou um Estado por violação direta a norma de direito social. De forma analítica, objetiva-se compreender os fundamentos e o impacto de tal decisão, sem desconsiderar os dois votos dissidentes que ocorreram no julgamento do caso que permitem-nos aprofundar e desenvolver ainda mais o debate sobre a justiciabilidade dos direitos sociais e os imbróglios de questões políticas e jurídicas em sua volta.

Publicado

06.01.2022