O TRABALHO INFANTIL DOMÉSTICO E A DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO NO CAPITALISMO

UM ESTUDO SOBRE O CASO MARIELMA DE JESUS

Autores

  • Heloyze Souza Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Palavras-chave:

Criança e adolescente, trabalho infantil

Resumo

Em 2005, Marielma de Jesus, de onze anos, foi brutalmente assassinada por um casal que a adotou sob a condição de que ela atuasse como babá em troca de benefícios básicos, como acesso à educação, roupas, alimentação e uma cesta básica mensal para sua família de origem. Esse caso expõe a exploração do trabalho infantil no ambiente doméstico, um fenômeno que se aproveita das profundas desigualdades sociais e econômicas existentes no Brasil. Este estudo busca compreender a conivência do sistema capitalista com a exploração do trabalho infantil doméstico. O objetivo foi investigar a relação entre o capitalismo e o trabalho infantil doméstico por meio de uma abordagem metodológica baseada na revisão de literatura. Foram examinados os fatores estruturais, econômicos e sociais que contribuem para a exploração de crianças nesse contexto. O caso do assassinato de Marielma de Jesus foi utilizado como um exemplo concreto dos desafios enfrentados no trabalho infantil doméstico, fornecendo reflexões abrangentes sobre o tema. Antes de analisar o caso, é relevante considerar o trabalho doméstico infantil e a divisão sexual do trabalho. Essa divisão consiste na distribuição desigual de tarefas entre homens e mulheres, sejam elas remuneradas ou não. Assim, as condições de vida de homens e mulheres não são determinadas por questões biológicas, mas sim por construções sociais (KERGOAT, 2007, p. 67). Nessa perspectiva, é imposto à mulher a responsabilidade exclusiva pelos trabalhos domésticos e pela reprodução (SAFFIOTI, 1978, p. 197). O serviço doméstico opera de forma marginalizada; isso porque, seguindo a lógica da divisão sexual do trabalho, a atividade doméstica remunerada trata-se, na perspectiva marxiana, de uma atividade não-produtiva dentro de um sistema capitalista. Na perspectiva do trabalho infantil, Marx (2011, p. 584) analisa sobre as primeiras etapas da industrialização que o trabalho feminino e infantil emergiu como a primeira expressão da aplicação capitalista da maquinaria. Sob essa análise, Marx consegue demonstrar que um dos efeitos do modo de produção capitalista é a exploração da força de trabalho de mulheres e crianças. O trabalho doméstico não estabelece uma relação de troca, visando lucro. É realizado diretamente para a família, o que significa que não gera capital (SAFFIOTI, 1978, p. 190). Nesse sentido, não produz mais-valia dentro de um sistema que busca principalmente o lucro. Nesse mesmo sentido, esse tipo de trabalho é considerado não-valor, ou seja, embora gere um certo tipo de valor, o próprio trabalho é percebido como subvalorizado, como um não-trabalho (CORREIA; BIONDI, 2011, p. 1-6). Marielma de Jesus, uma criança de origem socioeconômica vulnerável, foi inserida em uma situação de trabalho doméstico em troca de  necessidades básicas, as quais não podiam ser atendidas em sua família de origem. Essa condição de vulnerabilidade resultou em sua exploração laboral, culminando em seu assassinato. Apesar do caso ter ocorrido em 2005, observa-se que o sistema capitalista é conivente com a exposição de crianças a essa vulnerabilidade, considerando o trabalho explorado como uma forma subalterna, direcionada às mulheres da classe trabalhadora, independente da idade.

Biografia do Autor

Heloyze Souza, Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Discente em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Editora-geral da 25ª edição da Revista da Filosofia do Direito, do Estado e da Sociedade (FIDES/UFRN). Pesquisadora do Grupo de Estudos Sociedade e Trabalho (GESTO/UFRN). Pesquisadora do grupo Direito, Estado e Feminismos (DEFem/UFRN). Pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Trabalho Infantil (NETIN/UFRN). Estagiária da 2ª Vara Federal da Subseção do Rio Grande do Norte. Monitora da disciplina de Direito do Trabalho I. Foi monitora da disciplina de Direito Previdenciário. Foi membro do conselho editorial da 23ª e 24ª edições da Revista FIDES/UFRN. Participou da comissão editorial dos volumes 3 e 4 dos livros "Direito e Feminismos: estudos contemporâneos".

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On64 - DIREITOS HUMANOS, GRUPOS VULNERÁVEIS E VIOLÊNCIAS