CÁRCERE MATERNAL
A VIOLAÇÃO INSTITUCIONALIZADA DE DIREITOS HUMANOS DE MÃES E FILHOS NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS BRASILEIROS
Palavras-chave:
DIREITOS HUMANOS;, MATERNIDADE;, INFÂNCIA, ENCARCERAMENTOResumo
No sistema carcerário brasileiro, há mães. A maternidade encarcerada é prevista na Constituição Federal (artigo 5º, inciso L) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 9º). A Lei de Execução Penal brasileira dispõe a necessidade de berçário nos estabelecimentos penais femininos para que as condenadas possam cuidar de seus filhos e amamentá-los, no mínimo, até os seis meses (artigo 83, § 2o), além de seção para gestante/parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de seis meses e menores de sete anos a fim de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa (artigo 89). Todavia, sendo o cárcere uma forma institucionalizada e constante de violação de direitos (ZAFFARONI, 2021), questiona-se se existe uma postura estatal diferenciada quanto ao exercício da maternidade. Esse é o objeto da presente pesquisa, cujo objetivo é analisar a situação atinente à maternidade no cárcere através da metodologia empirista/indutiva para uma pesquisa qualitativa com estudo bibliográfico. O estudo justifica-se, pois mulheres que ocupam o sistema prisional não devem ter o seu direito à maternidade retirado nem seus filhos perdem direitos em decorrência da prisão de suas genitoras. A hipótese inicial é que se trata de uma violação institucionalizada de direitos humanos. Isso porque, consoante o Relatório Infopen Mulheres de 2018, 42.355 mulheres encontravam-se privadas de liberdade nas penitenciárias brasileiras, o que representa um aumento de 656% em relação ao total registrado no início dos anos 2000, salientando-se que a população prisional masculina cresceu 293%. Apenas 16% das unidades prisionais que recebem mulheres têm cela adequada para gestantes e somente 50% das gestantes/lactantes estão em unidades que possuem cela adequada. Ainda, 14% das unidades femininas/mistas têm berçário e/ou centro de referência materno-infantil e 3% possuem espaços de creche destinados a receber crianças acima de dois anos (INFOPEN, 2018, p. 29-34). Quanto aos filhos, o Relatório (2018) aponta 1.111 crianças em estabelecimentos prisionais brasileiros. A maioria delas – 727 – são maiores de dois anos, ressaltando-se que o Relatório de 2017 (p. 45) referia-se a 705 crianças na mesma situação, sendo 437 maiores de dois anos. Essas crianças estão cumprindo pena juntamente às mães e, diante disso, indaga-se se dever-se-ia aplicar às genitoras definitivamente presas o conteúdo das Regras de Bangkok – concedendo-se prisão domiciliar às mães, a depender do caso concreto – e não apenas às presas provisórias como previsto na Lei 13.769/2018 e considerando-se o Marco Legal da Primeira Infância. Tal situação no cárcere descumpre tratados de direitos humanos nos quais o Brasil é signatário, como a Declaração Universal de Direitos Humanos (artigo XXV) e as Regras de Bangkkok (regras 48 a 52 e 64). Fere, ainda, a Convenção sobre os Direitos da Criança (artigos 3º, 28 e 37) e o princípio da intranscendência da pena, pois os filhos acabam por cumprir as penas privativas de liberdade de suas genitoras. O resultado parcial da pesquisa mostra um distanciamento da perspectiva de Direito Penal Humano (ZAFFARONI, 2021), porque ao se submeter mães e crianças aos precários estabelecimentos prisionais brasileiros, está-se perpetuando uma violência institucionalizada.