ESTADO, MODERNIDADE, AMPARO AOS IDOSOS E A SOLIDÃO

REFLEXÕES SOBRE UM MAL-ESTAR SECULAR

Autores

  • Marco Aurelio Peri Guedes UFRRJ

Palavras-chave:

direitos humanos, solidão, idosos, vida, dignidade

Resumo

No século XX, quando já se identificavam os sinais da modernidade, um diagnóstico de seus efeitos nas pessoas já havia sido feito por Sigmund Freud: fobias, depressão, solidão, indiferença, abandono e uso de substâncias estupefacientes. Na Alemanha, entre 1890 e 1918, esses efeitos foram sentidos de modo contundente, motivo pelo qual a Constituição de Weimar (1919) formalizou o dever estatal de cuidados com o jovem, a mulher, a família e os idosos. Foi um ponto de inflexão do Direito Constitucional. Mais do que uma obrigação moral, uma política de Estado se tornava necessária, a refletir o valor da dignidade humana. O avanço da medicina, a diminuição das famílias, o crescente custo de vida e o planejamento familiar trouxeram à tona um problema de grandes dimensões às políticas públicas: os cuidados com os idosos, em múltiplas necessidades. Após uma vida de trabalho, grande parte dos idosos sofre redução de renda e alienação filial. As transformações da estrutura familiar deixam muitos idosos sozinhos, carentes de serviços, companhia e afetos. Atualmente na Europa, depois da Itália, Portugal está se tornando uma nação de idosos velozmente. E o despreparo para enfrentar esse cenário são evidentes: falta de lares públicos para idosos, abrigos para idosos privados com práticas desumanas, solidão nas regiões mais interiorizadas, ausência de recursos materiais e humanos no INEM, entre outros. A solidão merece ser enfrentada a partir de uma perspectiva psicanalítica, pois se trata de uma doença do espírito. O tema é de tal importância no Ocidente que a Inglaterra há quatro anos criou o Ministério da Solidão. Cumpre traçar um histórico de enfrentamento desse problema, no plano do Direito Constitucional e do Direito Comparado, sob uma perspectiva transdisciplinar. Por conseguinte, o objeto desse trabalho será analisar os primeiros resultados dessa política pública inglesa, suas propostas e soluções implementadas, como um modelo que pode ser empregado em caráter universal, na Europa e no Brasil. A metodologia consistirá em análise dos resultados desse Ministério, de outras experiências já existentes, como a desinstitucionalização do idoso, ou mesmo o conceito de polícia de proximidade nas regiões rurais, ambas experiências já em desenvolvimento em Portugal. A desestruturação familiar e os novos modelos de família, o desinteresse dos jovens pelos pais e avós são um sintoma da modernidade. Uma vez ignorada a obrigação moral de amparo, cabe ao Estado organizar políticas públicas, financiadas com recursos do Orçamento, de modo sustentável, de modo a que o idoso possa participar de atividades sociais, da vida cultural de sua cidade, ter amparo médico e psicológico. São medidas que podem ser desenvolvidas no plano municipal, pela sua capilaridade. Esse é o verdadeiro sentido de fraternidade indicado pela Revolução Francesa (1789) e universalizado com o constitucionalismo social pós-Weimar. São esses os vetores que permeiam o constitucionalismo português após 1933 e o brasileiro após 1934. Entendemos ser uma política de humanidade oferecer apoio psicológico e organizar novas formas de assistência social. É impossível, por ora, trazer resultados em definitivo, tendo em vista o estágio inicial em que se encontra essa realidade.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On102 - DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS IDOSAS EM PERSPECTIVA