O EXERCÍCIO DE VIOLÊNCIA CONTRA OS DESPOSSUÍDOS

PERSPECTIVA DA CRIMINOLOGIA CRÍTICA SOBRE O MASSACRE DO CARANDIRU

Autores

  • Pedro Lima CEUB
  • Isabela Nakashima CEUB

Palavras-chave:

Massacre; Carandiru; Criminologia Crítica; Sistema penal; Despossuídos

Resumo

  A riqueza intelectual da criminologia crítica funciona, por vezes, como um desafio a quem sobre ela escreve. Já que para além do simples estudo de caso, essa riqueza demanda contribuições que se mostrem relevantes ao pensamento criminológico. O objeto que nos abre a oportunidade para uma pequena contribuição a este campo é o evento de 02 de outubro de 1992, conhecido como massacre do Carandiru (nome que levava o complexo penitenciário que foi palco do ocorrido). O massacre em questão é um de tantos pontos de partida possíveis para compreender a lógica da violência praticada contra uma certa clivagem da população brasileira (chamada aqui de despossuídos). O problema posto é: o que justifica que, contra uma população vigiada constantemente, confinada em uma casa de detenção que foi outrora exemplo de prisão para o mundo, se pratique a execução de 111 presos?   Esse exercício (aparentemente irracional) de violência encontra uma explicação sociológica quando examinado à luz de certas lentes teóricas. Sob a perspectiva que nos oferece a criminologia crítica, busca-se demonstrar como o caráter de classe envolvido na condução da política criminal brasileira alimenta eventos como o 02 de outubro. Nosso estudo, se bem-sucedido em sua proposta, deve, através de uma revisão bibliográfica, comprovar a existência de uma programação incutida no Estado brasileiro, em especial no seu braço de políticas criminais, que açoda e extermina os despossuídos como uma forma constitutiva da própria pena. A questão da criação e persecução aos crimes das classes trabalhadoras mais pauperizadas, em face a não persecução dos crimes cometidos pelo grupo econômica e socialmente dominante, se fez objeto de estudo de diversos expoentes da criminologia crítica. Aquilo que Walton, Taylor e Young percebem enquanto um duplo-padrão punitivo fruto da lógica capitalista que se expande do mundo econômico ao mundo penal, toma novos contornos quando nos valemos desta perspectiva para observar o Carandiru. O arranjo de classes e as contradições da economia capitalista, influem e orientam a cadeia de produção da pena (preferindo ou preterindo seus clientes a partir de sua raça, classe e gênero), e fazem, no caso específico do Carandiru, do massacre, um pilar do cumprimento da sentença. O estudo proposto possuiu uma triste relevância. O Carandiru é um de um sem-número de massacres praticados contra os despossuídos. Poderíamos tratar aqui do massacre da favela do jacarezinho, ou do massacre do presídio de Altamira, todos filhos do mesmo processo social que tem como corolário o extermínio. A relevância repousa em, através do Carandiru, chamar atenção para todos os massacres e todos os despossuídos nas pás do moinho de gastar gente que se tornou o sistema penal brasileiro, comprovando, através do pensamento foucaultiano e da crítica marxista, o caráter estrutural dos nada raros espasmos de violência desse sistema.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO P16 - CRIMINOLOGIAS CRÍTICAS E DIREITOS HUMANOS: INTERSECÇÕES POSSÍVEIS