TODO SER HUMANO TEM DIREITO À... POLÊMICA
PAIXÕES SUSCITADAS A PARTIR DO TRATAMENTO PENAL
Palavras-chave:
POLÊMICA, POPULAÇÃO CARCERÁRIA, DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, RETÓRICA, PAIXÕES ARISTOTÉLICASResumo
Parafraseando Amossy (2017, p.101), a polêmica é edificada na circulação social dos discursos acerca de uma questão social de interesse público. De um lado, tem-se um Proponente; do outro, um Oponente, sendo que, protagonizando o impasse, estão incumbidos em formar os blocos de argumentos, inaugurando debates que acendem a opinião pública. Por instrumento de um tratado global, todos os indivíduos, independentemente de nacionalidade, cor, sexo e orientação sexual, política e religiosa, assim como quaisquer outras razões estão compreendidos por direitos essenciais a serem promovidos, o que originou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Entretanto, o Brasil apresenta problemas em efetivá-los, notadamente, perante a população carcerária, o que tem destacado a polêmica: diferentes atores sociais, entre os quais contam-se familiares de sujeitos encarcerados, assumem a função de Proponente, inaugurando um discurso pela aplicação de princípios fundamentais e de forma irrestrita. Em oposição, tem-se um ente da administração pública, envolvido em possíveis — mas notáveis — denúncias de negligência com respeito ao tratamento penal de custodiados, cujo alinhamento legal consiste em oferecer condições necessárias ao assistencialismo e reinserção social, valendo-se da preservação da dignidade desses. Sobre esse dissenso materializado na polêmica, buscamos apoio teórico em Amossy (2017), na obra Apologia da Polêmica, onde o discurso polêmico estrutura-se no campo da argumentação teórica, apoiado por características definidoras do discurso antagônico, sendo: a dicotomização, a polarização e a desqualificação do outro. Mais, com o objetivo de desvelar as possíveis paixões despertadas em consequência de um encadeamento polêmico de dois auditórios sociais, a saber, mães de indivíduos encarcerados e a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo (SAP), privilegiamos a retórica de base aristotélica (ARISTÓTELES, 2005; MEYER, 2003, entre outros), num confronto percorrido, também, a partir da trajetória das paixões, teoria esta apresentada por Figueiredo (2020). Para isso, analisamos o dissenso via polêmica, referenciados em exercício retórico, contidos em dois excertos publicados no veículo a Ponte em 2022, e que ampliou as possibilidades de enriquecimento dos debates que referenciam conflitos. Pudemos verificar que tais interações no espaço público decorrem segundo os valores socialmente partilhados, em conformidade com um posicionamento manifestado em causa própria. A percepção de uma carência de direitos positivados em um ambiente estritamente carcerário promove a instauração da polêmica, notadamente, se as possíveis negligências recebem a aderência do poder público, o qual, por vezes, utiliza-se da simplificação discursiva como recurso retórico. As vozes de familiares se inserem nos blocos antagônicos, destacando o choque nos discursos frente a um argumento institucional apresentado, cuja raiz é o debate sobre a dignidade. Verificadas a polêmica e as características assentadas, os auditórios contemplados passam a emitir emoções, sendo que o despertar do amor mobiliza o sentir de outras paixões, assim como o ódio, quando expostas as negligências acusadas. A impudência, a vergonha, o temor, a confiança, a calma, a compaixão e o favor foram paixões acionadas, conforme o posicionamento dos interlocutores. O dissenso é promotor de reflexões acerca de questões notáveis no espaço público.