QUEM TEM O DIREITO DE SER MÃE?

VIOLÊNCIAS, RACISMO E VIOLAÇÕES NA RETIRADA COMPULSÓRIA DE FILHAS/OS PELO ESTADO

Autores

  • Gracielle Feitosa de Loiola

Palavras-chave:

Mulheres. Racismo. Raça/Cor. Maternidade. Judicialização. Acolhimento Institucional.

Resumo

Trata-se de uma reflexão que tem como base a pesquisa desenvolvida no doutorado em Serviço Social realizado no Programa de Pós-graduação da PUC-SP. A pesquisa volta-se a uma dimensão do cotidiano e da realidade de profissionais e famílias que lutam e resistem à lógica de desigualdade, julgamento, moralismo e preconceitos, em especial nas situações que envolvem o uso de substâncias psicoativas, cuja presença tem sido associada de forma automática à impossibilidade de exercício da maternidade e da paternidade, o que mascara situações de violências, racismo e desproteções muitas vezes invisibilizadas em nome do melhor interesse e proteção da criança. Aqui pretende-se dá ênfase aos achados da pesquisa que evidenciaram a face contraditória da judicialização e do afastamento de crianças e adolescentes de suas famílias de origem pela medida protetiva de acolhimento institucional ou familiar, conforme previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Nos caminhos percorridos desvendamos as desigualdades sociais vividas pelas famílias, com prevalência de mulheres negras e a serviço do que e de quem a convivência familiar tem sido direcionada. Nessa perspectiva, ao considerar o quesito raça/cor das crianças e adolescentes que estavam ou passaram pelos serviços de acolhimento institucional conveniados com a SMADS no ano 2019, identificou-se que dos 4315 registros de acolhimento (sendo 135 na modalidade Casa Lar e 4180 na modalidade SAICA), 66,5% (2870) eram de crianças ou adolescentes identificadas/os como negras/os; 32,3% (1393) de crianças ou adolescentes brancas/os; 0,8% (33) amarelas e 0,5% (19) de indígenas. Ao debruçarmos nosso olhar sobre as famílias que tem os/as filhos/as afastados do seu convívio pela determinação judicial de acolhimento institucional ou familiar, de um modo geral, poderemos identificar indicadores que revelam algumas similaridades, como: o histórico de um acesso fragilizado ou mesmo de um não acesso a bens e serviços que garantam um padrão mínimo de subsistência, relações de trabalho precarizadas caracterizadas por vínculos informais e subempregos, insegurança de renda com impacto direto na condição habitacional, baixa escolaridade, entre outros aspectos que revelam a condição de desproteção social vivenciada rotineiramente. Tais dados revelam que não apenas na Justiça Penal (ALVES, 2015), mas também na Justiça da Infância e Juventude, os corpos encarcerados e afastados do convívio com a família de origem por meio do acolhimento institucional ou familiar são corpos negros. Nesse cenário, cabe questionar: quem pode ser mãe? As informações disponíveis sobre cor/raça revelam que as mulheres cujos filhos/as são “sequestrados” ainda na maternidade/hospital têm cor. É fundamental afirmar que são as mulheres negras e pobres que têm os/as filhos/as retirados de seu convívio, sendo a questão étnico/racial uma chave importante e necessária para conhecer a realidade social vivida pelas famílias, não podendo ficar oculta das análises e estudos profissionais.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On93 - MATERNIDADES, MATERNAGENS, JUSTIÇA REPRODUT. E DIREITOS HUMANOS