EQUIDADE EM TEXTOS/DOCUMENTOS CURRICULARES BRASILEIROS [2017 e 2018]
CRISE DISCURSIVA E RISCOS À DEMOCRACIA
Palavras-chave:
EQUIDADE; TEXTOS/DOCUMENTOS CURRICULARES; DISCURSOSResumo
Diante das desigualdades sociais e educacionais, inegáveis no território brasileiro, os textos/documentos curriculares têm sido utilizados, nacional, regional e localmente como instrumentos de redução das desigualdades, limitados aos espaços escolares, bem como do alcance da educação de qualidade. Desde a década de 1990, o conceito de “equidade” ganha destaque no campo educacional internacional e, consequentemente, no campo curricular, reconhecendo que todos são diferentes, os direitos de aprendizagem são de cada um, e não de todos. Essa opção pelo individual, ao invés do comum, move as políticas educacionais da “igualdade” para a “equidade”. Nos anos de 2017 e 2018 assistimos a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), destinadas às etapas da educação básica brasileira, isto é, educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, de um lado, como expressão de política pública de democratização da educação e; de outro, fundada nos interesses de grupos neoliberais, que objetivam ofertar aprendizagens essenciais para todos, garantindo “a igualdade educacional sobre a qual as singularidades devem ser consideradas” (BRASIL, 2017, 2018, p. 15). Neste contexto, a promessa de ofertar oportunidades educacionais iguais para superar as desigualdades, traduz-se em um currículo com foco na equidade, “que pressupõe reconhecer que as necessidades dos estudantes são diferentes” (idem., p. 15). Compreendendo que este texto/documento visa a “construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva” (idem., p. 7), nos limites deste trabalho incursionamos por um recorte de pesquisa de dissertação, orientado pelas técnicas da pesquisa bibliográfica e análise documental, analisando a “equidade”, “igualdade” e “desigualdades” nos discursos sobre justiça apresentados pela BNCC e, daqueles que chamamos de seus autores (Movimento pela Base). Tal análise construída na premissa de que os discursos se encontram situados/projetados no/pelo neoliberalismo que reclama capacidades individuais, cognitivas e meritocráticas. Compreendendo que os discursos educacionais, inseridos nos mercados linguísticos (BOURDIEU, 1997) são informados pelos organismos internacionais, identificamos a doxa da razão neoliberal, na construção do homo economicus (DARDOT, LAVAL, 2016), determinado na/pela competição, supondo ser perfeitamente justo não existir vagas para todos. Este modelo de justiça da igualdade de oportunidades (DUBET, 2011) meritocrático, questiona as regras do jogo e não o próprio jogo que (re)produz desigualdades, que são combatidas e sentidas a um nível mais individual (DUBET, 2020). Nível este, justificado por três fatores, a saber: 1) ampliação de direitos individuais; 2) mudanças no mercado de trabalho; 3) e multiplicação de pautas identitárias. Diante destes, os discursos alcançam as organizações filantrópicas (SANTOMÉ, 2011), como o Movimento pela Base, que alegam seu interesse na educação, pelo compromisso com uma sociedade mais justa e democrática. Percebe-se que a mobilização dos conceitos de “justiça”, envolto na “igualdade” e desigualdades” na BNCC (2017 e 2028), perpassa a crise discursiva que promove uma inutilização prática das categorias fundadoras da democracia liberal, ao mesmo tempo, que nos reclama estar alerta para a linguagem corrente que obscurece diferenças, constroem sub-repticiamente os canais por onde avançam as concepções neoliberais (DAGNINO, 2004).