O USO DA MÃO DE OBRA DE MIGRANTES NORDESTINOS EM CONDIÇÕES ANÁLOGAS À ESCRAVIDÃO

O PANORAMA BRASILEIRO

Autores

  • Ana Beatriz Guimaraes Godinho FACULDADE PRESBITERIANA MACKENZIE RIO

Palavras-chave:

TRABALHO, ESCRAVIDÃO, NORDESTINOS, MÃO DE OBRA, BRASIL

Resumo

A escravidão representou a base das relações de trabalho no Brasil ao longo do período colonial perdurando oficialmente até maio de 1888 – ocasião em que foi sancionada a Lei Áurea. Entretanto, a abolição da escravatura limitava-se tão somente a uma liberdade formal, não havendo a implantação de políticas públicas voltadas aos libertos que possibilitassem sua inserção no mercado de trabalho e lhes conferisse a devida dignidade. Mais de cento e trinta e cinco anos se passaram e a tradição escravocrata parece ainda estar arraigada na conduta social e nos modos de produção. Embora o país tenha ratificado oitenta e duas Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e esteja sob a égide de uma Constituição Cidadã, a escravidão moderna se apresenta com novos contornos. Cabe destacar que não é necessária a violência física para caracterizar o trabalho análogo à escravidão: basta ser constatada a submissão a trabalhos forçados ou jornadas exaustivas, restrição da locomoção e sujeição a condições degradantes de trabalho. Neste cenário, observa-se que grupos socialmente vulneráveis estão mais suscetíveis a este grau de submissão. É o caso dos trabalhadores oriundos da região Nordeste do país que, por vezes, encontram-se em condições de extrema pobreza e, sem enxergar perspectivas de subsistência, são persuadidos por falsas promessas de trabalho. O uso da mão de obra nordestina remonta à década de 60, quando as chamadas “carradas” (caminhões que transportavam lavradores clandestinamente) cruzavam o Brasil com destino, na maioria das vezes, à região Centro-Oeste. Após serem transportados nas carretas abarrotadas com a lona encobrindo o que se considerava uma mercadoria, estes trabalhadores eram “comprados” por fazendeiros que quitavam o custo da viagem e então coagiam aqueles indivíduos a produzir arduamente para solver suas dívidas. O objetivo do presente artigo é analisar, a partir de pesquisa documental, do estudo de casos concretos e do levantamento de dados junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, a origem da exploração da força de trabalho nordestina e sua permanência até os dias atuais, com foco nos estados que acumulam maior incidência de ocorrências, quais sejam, Goiás, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. A partir desta retrospectiva histórica, busca-se compreender de que modo a servidão de nordestinos se perpetua e com quais instrumentos o ordenamento jurídico brasileiro pode combater a escravização deste grupo vulnerável. Como hipóteses inicias, destacam-se: a seca no Nordeste seria um fator impulsionador da migração; mais de oitenta por cento dos obreiros não possuem qualquer conhecimento acerca de direitos trabalhistas; a crise econômica descortinada após a pandemia do Covid-19 contribuiu para o recrudescimento deste problema. A pesquisa se mostra relevante por se tratar de tema que configura grave violação aos direitos humanos e, sobretudo, em um momento onde o debate sobre o trabalho escravo no Brasil ganha amplitude.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO P11 - SUJEITOS SOCIALMENTE VULNERÁVEIS E DIREITOS HUMANOS