LINCHAMENTOS E NORMALIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA SACRIFICIAL CONTRA GRUPOS VULNERABILIZADOS NO BRASIL
Palavras-chave:
LINCHAMENTOS;, VULNERÁVEIS, PRECARIEDADES, DISCRIMINAÇÕES, DETERMINANTESResumo
Implicado em um contexto de dissonâncias entre o perfil normativo e a realidade de profundas precariedades; a expressiva incidência de linchamentos no Brasil confronta o desenho constitucional, democrático e garantista. Ainda que escassa a literatura, dada a invisibilidade do fenômeno; há pesquisas pelos estados brasileiros que monitoram ocorrências, pautando-se na Imprensa e nos casos levados ao Judiciário. Como base material e considerando tratar-se da melhor sistematização sobre o fenômeno no país por envolver diversas instituições de pesquisa, o relatório Linchamentos: um estudo sobre casos noticiados em Manaus, Grande São Luís e Grande Vitória (2011-2020) aponta a razão de 01 linchamento a cada 3 dias e o total de 600 ocorrências registradas no período, tratando-se de derradeiro problema humanitário para o Brasil e para a governança global. Por esse, depreendeu-se que os sacrificáveis são, predominantemente, homens (90%), jovens, negros (60%) ou pardos (10%), com faixa etária média de 26 anos, permitindo constatar o elemento socioeconômico e racial como determinante para a eliminação de indivíduos de grupos de sujeitos socialmente vulnerabilizados. Ademais, pelo que os dados não demonstram, justifica-se a relevância da pesquisa: pouco foi sistematizado sobre linchamentos de mulheres; nada foi dito sobre os praticados contra população LGBTQIA+, contra adolescentes e pessoas idosas, situando a faixa etária e a identidade de gênero como marcadores de diferenças. Objetivou-se, então, analisar as diversas tensões, racionalidades e dispositivos de dominação de corpos nos casos de linchamentos ocorridos no pós-2010, considerando as relações com as estruturas sociais desiguais, discriminatórias e precárias que demarcam a sociedade brasileira. A pesquisa fez abordagem predominantemente qualitativa, com natureza exploratória e usou da triangulação de métodos, combinando técnicas e procedimentos que permitam a compreensão da realidade, com prevalência do método crítico-dialético, rompendo com estruturas postas, confrontando a aparência com a essência e observando as tensões nas diversas relações sociais permeadas por contradições que demarcam o fenômeno dos linchamentos, com as suas circunstâncias veladas e reveladas na ótica das distintas desigualdades. Elegeu-se como problema de pesquisa: Em que consistem as diversas racionalidades e dispositivos de controle e dominação de corpos nos casos de linchamentos ocorridos no Brasil pós-2010 e como eles se relacionam como o aniquilamento de grupos historicamente excluídos e marginalizados? Como hipótese: O não-reconhecimento do sujeito socialmente vulnerabilizado como uma vida passível de luto e dos linchamentos como fenômeno complexo para pauta da governança global humanitária afigura-se como um produto tensionado demarcados por históricos processos de exclusão. Os resultados parciais, obtidos pela análise do conteúdos dos dados colhidos, permitem depreender que a eleição da pessoa sacrificável segue uma lógica própria; é ato racionalizado que revela ou evidencia diversos interesses e racionalidades, declarados ou não, e reproduz a estrutura conservadora e discriminatória da sociedade brasileira; e trata-se de questão sustentada nas lógicas do empobrecimento estrutural em um contexto de normalização das violências, de beneplácito da sociedade de base neoliberal e de construção do inimigo público que deve ser eliminado como expressão da gestão pública dos indesejáveis.