VIOLÊNCIAS CONTRA MULHERES TRANSGÊNERAS E CISGÊNERAS NO BRASIL

Autores

  • Kelly Roberta Estrela Marinho Neto FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ (FIOCRUZ)

Palavras-chave:

VIOLÊNCIA DE GÊNERO, SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS, SAÚDE PÚBLICA, DIREITOS HUMANOS

Resumo

A violência de gênero se tornou um fenômeno de características globais sob diversas formas denotando um grave problema de saúde pública que precisa ser visto e ouvido por toda a sociedade, pois gera custos diretos e indiretos, principalmente na área da saúde. O Brasil ocupa o quinto lugar no ranking mundial de violência contra mulher cisgênera; e a primeira posição entre os países que mais matam pessoas transgêneras, sendo em sua maioria travestis e mulheres transexuais. A violência contra mulher cisgênera é pautada no sexismo que traz como pratica a dominação masculina e está presente em toda a sociedade acendendo um alerta sobre a violência vivenciada dentro dos lares. A violência contra mulher passou a ser pautada pelos movimentos feministas, possibilitando diversas conquistas e a Lei Maria da Penha promulgada em 2006 foi um marco no enfrentamento desse agravo, mas ainda não abrange as mulheres transgêneras. A partir de então, a violência contra a mulher passa a ser qualquer ação, baseada em gênero, que cause sofrimento físico, psíquico, moral, ou morte, seja no âmbito público ou privado. A violência, entretanto, apenas se tornou de notificação compulsória, a nível nacional, em 2011; sendo incluída a população LGBT em 2015. A mulher transgênera são mais suscetíveis a sofrerem discriminação e preconceito por possuírem padrões de identidades diversas daquelas impostas pela sociedade heteronormativa, e a violência tendem a ser mais agressiva. O objetivo do estudo é comparar as notificações de violência interpessoal contra mulheres cisgêneras e transgêneras de 20 a 59 anos no Brasil, no período de 2015 a 2021. Trata-se de estudo descritivo, utilizando dados anônimos e de acesso irrestrito do Ministério da Saúde. Foi calculado o percentual de cada categoria das variáveis estudada, estratificando por mulheres cisgêneras e transgêneras. O teste qui-quadrado de Pearson foi utilizado para avaliar a existência de diferença estatisticamente significativa entre os estratos (p ≤ 0,05). Foram elegíveis 605.983 notificações, sendo 1,8% em mulheres transgêneras. As notificações foram registradas em 84,8% dos municípios para mulheres cisgêneras e 31,7% para transgêneras. Houve predomínio de notificações em mulheres mais jovens de 20 a 39 anos (71,9%) e negras (55,3%), sendo proporcionalmente maior entre as transgêneras 74,8% e 59,8%, respectivamente (p < 0,001). A maioria das notificações foi de violência física (84,8%), sendo proporcionalmente maior nas transgêneras (88,3%; p < 0,001); seguida de violência psicológica (40,1%), que foi maior nas cisgêneras (40,2%; p < 0,001). Os principais agressores foram homens (76,9%), sendo proporcionalmente maior entre as cisgêneras (84,1%; p < 0,001); e conhecidos, em particular cônjuge e ex-conjuge (48,0%), mas entre as transgêneras o percentual de desconhecidos foi proporcionalmente maior (19,2; p < 0,001). A notificação de violência ainda não reflete a realidade, em particular para mulheres transgêneras. Muitos direitos, contudo, foram conquistados ao longo do tempo em diferentes áreas, possibilitando que, o que foi por muito tempo silenciado, hoje possa ser ouvido e ser objeto de estudos e reflexões.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On64 - DIREITOS HUMANOS, GRUPOS VULNERÁVEIS E VIOLÊNCIAS