A NEGAÇÃO DA IDENTIDADE PELO USO DA TORTURA

APLICAÇÃO DIFERENCIADA DA LEI N. 9.455/1997 EM DESFAVOR DE AGENTES ESTATAIS E PRIVADOS NO MUNICÍPIO BRASILEIRO DE GOIÂNIA, ESTADO DE GOIÁS

Autores

  • Luiz Antonio Silva Junior Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Palavras-chave:

TORTURA;, SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL;, DIREITOS HUMANOS;, IMPUNIDADE.

Resumo

Esta investigação teve como objetivo principal identificar e analisar os procedimentos e processos relacionados a tortura no município de Goiânia, a partir dos dados do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) durante os anos de 1997 a 2017, lapso temporal referente aos vinte anos da vigência da lei pátria sobre o crime. A aludida prática possui origens históricas e nega a identidade do ser humano, sendo vedada pelas normas internacionais de proteção dos direitos humanos. Justifica-se a relevância do estudo em virtude de compreender-se que ele possibilita não apenas o desvelamento, mas, sobretudo, o enfrentamento da degradação dos direitos humanos hodiernamente. Objetivou-se, também, ressaltar a importância das decisões das cortes internacionais de direitos humanos para a construção do conceito de tortura. No Brasil, a Lei n. 9455/1997 foi promulgada depois de mais de oito anos da proibição constitucional; tipificou as condutas consideradas como tortura e ampliou o rol dos sujeitos que podem cometer o referido delito. Dessa forma, contrariando o que preveem o regramento internacional de direitos humanos, qualquer pessoa pode realizar o fato típico no País. A tortura é praticada por quem tem poder, seja estatal exercido principalmente pelas forças policiais ou por quem possui o poder familiar. Assim, um questionamento permeou o desenvolvimento da pesquisa, isto é, se haveria uma diferenciação na solução dos casos envolvendo determinados sujeitos ativos, ou seja, se ocorreria mais punições em desfavor de agentes públicos do que de agentes privados? A hipótese inicial era positiva, pois haveria mais processos envolvendo funcionários públicos do que agentes privados. Todavia para a obtenção de uma resposta precisa realizou-se uma pesquisa empírica fundada no fluxo de processamento do Sistema de Justiça Criminal (SJC), com ênfase na modalidade longitudinal retrospectiva. O trabalho visou verificar, quantitativamente, a taxa de atrito, considerando a proporção de casos de tortura registrados pelos órgãos primários do SJC, mediante o concatenamento dos trâmites processuais que culminaram com uma sentença condenatória ou absolutória. No tocante ao aspecto qualitativo, buscou-se identificar o perfil dos sujeitos ativos e passivos envolvidos no crime, bem como as respectivas decisões. O TJGO informou que 278 processos versavam sobre tortura, porém 3 deles eram sobre homicídios dolosos qualificados pela tortura, 2 pedidos de interdição do complexo penitenciário, tendo como uma das causas a tortura, 3 tinham sido redistribuídos para outra comarca e 1 processo não foi permitido o acesso, porque estava concluso com o magistrado. Outros 9 tratavam da competência das Varas de Execução Penal, assim a base empírica constituiu-se em 260 processos que estavam em andamento ou arquivados. E, assim, ao final, a investigação verificou a existência de um baixo índice de punição por tortura, principalmente em razão da prescrição e da falta de provas, havendo uma discrepância nos percentuais quando se compara os grupos de sujeitos ativos, punindo-se proporcionalmente mais os agentes privados (19,35%), do que os agentes públicos. A grande maioria dos investigados eram funcionários públicos (390 pessoas), contudo nenhum policial civil foi apenado por tortura e apenas 3,73% dos policiais militares receberam uma pena definitiva.

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On63 - VIOLÊNCIA, SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS