ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIGITAL E O AUXÍLIO EMERGENCIAL

Autores

  • Fellipe Guerin Leal UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina
  • Marcelo Boss Fabris UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

Palavras-chave:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIGITAL, TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TICS), INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL (AI), AUXÍLIO EMERGENCIAL (AE)

Resumo

O tema é o uso das tecnologias da informação e da comunicação (TICs) e da inteligência artificial (IA) pela Administração Pública brasileira. O recorte é analisar como as TICs e a IA foram empregadas na concessão do Auxílio-Emergencial, prestação social específica ao período da pandemia de COVID-19. O problema de pesquisa refere-se à análise dos impactos da imposição das TICs como meio exclusivo para o acesso das populações mais vulneráveis ao benefício e questionar se a análise dos requerimentos via IA é compatível com o ordenamento jurídico brasileiro. São duas as hipóteses: a imposição das ferramentas digitais como meio único de requerimento do benefício acarretou exclusão de expressivo número de beneficiários, pertencentes aos extratos sociais mais desfavorecidos da população brasileira; e a análise dos requerimentos exclusivamente através da IA vulnerou não só o princípio constitucional do contraditório, mas também os princípios atinentes à correção da decisão algorítmica, explicabilidade e reversibilidade. O método de pesquisa é indutivo e envolve o estudo de caso do auxílio emergencial como base para possíveis generalizações sobre o uso das TICs e da IA pela Administração Pública Digital. A técnica de pesquisa é bibliográfica e documental. Os objetivos são diagnosticar as adversidades no caso do auxílio-emergencial no tocante ao acesso e à correção das decisões proferidas pela IA, com o fim de avaliar a implementação das TICs pela Administração Pública brasileira. Dentre resultados encontrados, destacam-se: a exclusividade do canal digital limitou a possibilidade de requerimento àqueles que não detinham condições técnicas mínimas (acesso a celular ou computador e pacote de dados de internet) e alfabetização digital necessária para operar o equipamento eletrônico e o sistema digital, o que privou cerca de vinte por cento dos cidadãos das classes D e E de obter acesso ao benefício; a decisão algorítmica desrespeitou o devido processo legal administrativo e as diretrizes da explicabilidade e da reversibilidade, porque não havia possibilidade de produção de prova documental para demonstrar a incorreção ou desatualização dos dados constantes nas bases governamentais, utilizadas como único critério para a concessão automática do benefício. Do ponto de vista da diretriz da explicabilidade, os dados das bases governamentais utilizadas não foram informados ao cidadão, tampouco sujeitos a sua confirmação, assim como o indeferimento do auxílio-emergencial fundamentava-se em respostas padrão, sem detalhamento individualizado. Por fim, sob a ótica da diretriz da reversibilidade, a contestação ao indeferimento não permitia a produção probatória realidade fática cambiante, o que inviabilizava qualquer perspectiva de reversão da decisão algorítmica. A justificativa da presente pesquisa está no fato de que a implementação cada vez mais acelerada das TICs e da IA no âmbito da Administração Pública demanda uma análise crítica acerca de seus resultados práticos e de sua compatibilidade com o ordenamento jurídico nacional. O caso do auxílio-emergencial afigura-se como exemplo de política pública realizada através das TICs que utilizou amplamente a IA para a análise de expressivo número de requerimentos, tornando-se relevante objeto de estudo para a otimização de futuras implementações pela Administração Pública.

Biografia do Autor

Fellipe Guerin Leal, UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

Mestre em Direito (UFSC) e em Ciência Política (UFRGS), servidor público da Justiça Federal e doutorando em Direito (UFSC).

Publicado

03.10.2023

Edição

Seção

SIMPÓSIO On58 - IMPACTOS PROCEDIMENTAIS ADMINISTRATIVOS NOS DIREITOS HUMANOS